Casa Civil abre crise entre PT e Governo do Estado
Pressionada pelo PT, após um dia marcado por mais uma crise interna, com a decisão do novo chefe da Casa Civil, Everaldo Martins (que assumirá o cargo na próxima segunda-feira), de renunciar em protesto contra o esvaziamento da pasta, a governadora Ana Júlia Carepa recuou.
Anunciou que publicará no Diário Oficial de hoje a revogação do decreto publicado ontem tirando da Casa Civil poderes para a contratação de servidores do Grupo de Direção e Assessoramento Superior, os famosos DAS, e também de comissionados que não fazem parte desse grupo.
Em nota distribuída por e-mail, pela Secretaria de Comunicação, às 22h11 de ontem, a governadora explicou que “a decisão foi motivada pelas especulações de que o decreto esvaziava o papel do novo chefe”. Na mesma nota, a governadora anuncia que, após a posse, será criada uma comissão formada por servidores da Secretaria de Governo (Segov) e da Casa Civil para estudar “a melhor forma e o melhor momento de efetivar a mudança administrativa, a fim de reduzir o peso burocrático” da pasta a ser comandada por Martins.
A gota d’água para a mudança de rumo teria sido uma mensagem enviada à tarde, via celular, por Martins para a governadora comunicando que não assumiria o cargo na segunda-feira. Outro ponto de pressão foi a ameaça de que a irmã de Everaldo, a prefeita de Santarém, Maria do Carmo Martins, poderia bater chapa com Ana Júlia na convenção do partido onde serão referendadas as candidaturas às eleições de outubro deste ano.
No decreto que gerou perplexidade em petistas de todas as tendências e patentes, a governadora passava para a Secretaria de Governo - comandada por Edilson Rodrigues - os poderes para nomear e exonerar dentro da administração direta do governo cargos em DAS e também as prerrogativas de assinar exonerações. Fontes consultadas pelo DIÁRIO explicaram que o decreto seria um golpe de misericórdia na já combalida Casa Civil. Seria a primeira vez na história recente do Estado que os poderes para essas contratações e exonerações ficariam com outra secretaria.
O decreto era o ápice de uma série de mudanças que tiveram início logo após o anúncio de que Cláudio Puty seria substituído por Everaldo Martins na Casa Civil. No dia 3 de fevereiro, Puty assinou portaria transferindo a responsabilidade por “deslocamento de aeronaves” para o secretário particular da governadora, Paulo Cunha. Foi o começo da operação de esvaziamento da pasta que perdeu também a gestão do Programa Pró-Jovem, considerada a principal plataforma de Cláudio Puty em sua campanha rumo à Câmara Federal.
O programa que atende jovens de 18 a 29 anos oferece bolsas de 100 reais, para que eles concluam o ensino fundamental e permite que façam também cursos profissionalizantes. Já atendeu cerca de oito mil pessoas e passará agora a ser gerido pela Secretaria de Desenvolvimento Social, que tem como titular Eutália Barbosa.
AVISO
As bancadas federal e estadual e a direção do PT não foram consultadas sobre a mudança e sequer receberam aviso prévio. Nem mesmo Martins foi comunicado. O deputado federal Paulo Rocha, por exemplo, só ficou sabendo da novidade no final da tarde ao se encontrar com o presidente do PT, João Batista.
Everaldo Martins tomou conhecimento do decreto pela mulher, a secretária de Pesca, Socorro Pena, que havia recebido telefonemas de amigos com a informação. Coube ao secretário de Governo, Edilson Rodrigues, fazer o comunicado oficial ao novo chefe da Casa Civil, o que ocorreu durante um encontro por volta das 14h (o Diário Oficial circula pela manhã). Rodrigues explicou as razões para a troca e afirmou que a conversa tinha sido “bastante cordial”.
Everaldo Martins não falou com a imprensa, mas para amigos disse ter ficado “P” com a decisão e, após analisar o decreto, resolveu renunciar ao cargo, o que foi comunicado na mensagem por celular que levou ao recuo da governadora.
Durante a tarde de ontem, quando o decreto ainda estava em vigor, petistas ouvidos pela reportagem disseram estar “perplexos” e “desconfortáveis” com a decisão de Ana Júlia. No início da noite, o assunto foi tema de uma reunião na sede do PT, no centro de Belém. O encontro reuniu os deputados federais Paulo Rocha, Zé Geraldo e Beto Faro com o presidente do diretório estadual da legenda, João Batista.
Depois de quase uma hora e meia a portas fechadas, nenhum dos deputados aceitou dar entrevistas. A ordem era não potencializar a crise e avaliar nas horas seguintes que medidas poderiam ser tomadas. Batista ainda chegou a afirmar ao DIÁRIO que as questões administrativas da Casa Civil não estavam no rol de preocupações dos petistas e que o importante era “o poder político do novo chefe da
Casa Civil”.
Determinação foi considerada desastrosa
Internamente, contudo, parlamentares e lideranças da legenda que não têm cargo eletivo não escondiam o descontentamento e classificaram a decisão de “desastrosa”. “Do que os aliados reclamam?
Não é da falta de confiança? Você acha que essa mudança vai ajudar a reconstruir isso?”, indagou um parlamentar. A avaliação dos petistas é de que ao esvaziar a Casa Civil, a governadora sinaliza que Everaldo Martins terá a autonomia reduzida, o que dificultará o trabalho dele junto à base aliada e aos partidos que venham a se juntar ao PT nas eleições deste ano, justamente uma das principais missões dele no governo. “Na prática, significa que o Everaldinho será um articulador enfraquecido. Suas promessas ficarão cercadas de desconfiança e isso é ruim para ele, mas muito pior para o governo”, avaliou outro petista.
Responsável pelas contratações caso o decreto continuasse valendo, o secretário de Governo, Edilson Rodrigues, disse que a mudança foi pedida por ele. “A Secretaria de Governo já acompanha a contratação de temporários e deveria estar com essa função (contratação de DAS) há bastante tempo”, disse explicando que à Casa Civil caberia o acompanhamento da contratação de assessores especiais, atendimento de demandas do Gabinete da governadora e as negociações políticas. Informado que a decisão havia causado perplexidade entre petistas de várias tendências, Rodrigues disse que não estava “buscando desconfortos”. “Estamos corrigindo situações”. O atual titular da Casa Civil, Cláudio Puty, não se manifestou sobre a mudança.
SUBSTITUIÇÃO DE CLÁUDIO PUTY
A substituição de Puty por Martins foi fruto de um acordo feito pela governadora Ana Júlia Carepa com as tendências petistas “Unidade na Luta”, comandada pelo deputado federal Paulo Rocha, “Articulação Socialista”, dos deputados estadual Carlos Bordalo, e federal, Beto Faro; além do “PT pra Valer”, que tem entre as lideranças o secretário de Estado de Transporte, Valdir Ganzer, e a deputada estadual Bernadete ten Caten, atual líder da bancada do PT na Assembleia Legislativa.
O acordo foi fechado após uma crise que teve o auge durante uma reunião de Puty com prefeitos do Sul do Pará - onde fica a base eleitoral da deputada Bernadete - sem que ela tivesse sido avisada. Para inflamar mais os ânimos, a Democracia Socialista, tendência da governadora Ana Júlia, teria incentivado o superintendente do Incra em Marabá, Raimundo Oliveira, a sair candidato a deputado estadual, dividindo a base de ten Caten. Com Puty na Casa Civil, as outras tendências estavam se sentindo alijadas no apoio do governo aos candidatos petistas à Câmara Federal e à Assembleia Legislativa, enquanto a DS estaria sendo beneficiada, uma vez que o próprio secretário será candidato.
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